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O Império da Boa Sociedade: A Consolidação do Estado Imperial Brasileiro

quarta-feira, 2 de junho de 2010


O Império da Boa Sociedade: A Consolidação do Estado Imperial Brasileiro

Resumo escrito:Simone Capovilla
Apresentar o processo através do qual o Império de D. Pedro II emergiu como Estado soberano, considerando as aspirações iniciais, mudanças de rota e disputas entre os atores sociais envolvidos neste processo: este é o objetivo principal de Mattos e Gonçalves na construção de seu O Império da Boa Sociedade: A Consolidação do Estado Imperial Brasileiro<1>.

Contudo, a obra oferece um aprofundamento maior do que os objetivos acima descritos, tanto pela riqueza documental que oferece, quanto pela sua própria proposta de organização: a partir de três espaços/lugares definidos - a Casa, a Rua, o Estado- o leitor é, inicialmente, convidado a ingressar na alma das principais forças que compunham o contexto econômico, social e político do período. Forças que serão, ao longo da narrativa, melhor detalhadas, sem nunca perder de vista estes espaços/lugares - a eles retornando, seja para sinalizar de que forma são ocupados pelos diferentes atores sociais, seja para demonstrar as alterações de posição ocorridas na própria tríade de poder composta por estes espaços/lugares.

A partir da abdicação de D. Pedro I, os autores mergulham no ponto crucial da obra: quem era brasileiro, naquele 7 de abril de 1831? Assim, o capítulo intitulado A Casa vai demonstrar os sentimentos da camada dominante da sociedade a respeito deste questionamento - uma sociedade profundamente hierarquizada, baseada num modelo econômico colonial escravista.

Na Rua, podemos perceber a diferença entre os liberais moderados e liberais exaltados: os primeiros, encarando a "prudência, a moderação e a ordem" como condições essenciais para a integridade do Império; os segundos, esperando que a Regência Provisória resultasse em maior liberdade e representatividade nos desígnios do Império. Um sentimento que se espalhou pelas ruas, através de manifestações que geraram pânico nos grupos mais conservadores. Mas a Rua era, também, local de medos outros: notícias de insurreições negras em várias partes do Império, a superioridade numérica populacional dos escravos e a própria capoeira eram motivo de pânico. A Rua era, portanto, neste momento, o local da desordem.

O ano de 1831 parecia indicar aos liberais moderados que tudo correria bem. Neste período, está também, situada a discussão sobre o papel do Estado: tido como necessário, o Estado deveria ter seus poderes limitados, de modo a não poder interferir plenamente nos interesses das classes dominantes. Com relação ao "como fazer isso", é que as opiniões se dividiram: para o liberais moderados, apesar de algumas divergências, a solução era uma monarquia constitucional. Para o liberais exaltados adeptos da monarquia, a solução passava por um modelo, mais democrático, de cunho federativo. Mas havia, também, os liberais exaltados republicanos - que acabaram conferindo fama genérica a todos os exaltados. Finalmente, no extremo oposto de todas estas correntes, estava José Bonifácio e os restauradores: para eles, a volta ao modelo do Primeiro Reinado era o sonho acalentado.

A aproximação entre exaltados, moderados e alguns restauradores acabou apresentando diferentes resultados: o fortalecimento do poder local - através de maior poder conferido aos juizes de paz locais -, a formação da Guarda Nacional, e a Reforma Constitucional (Ato Adicional) de 1834. Através desta última, estava mantido o Governo Moderador, a vitaliciedade do Senado, a criação das Assembléias Legislativas Provinciais - e o conseqüente enfraquecimento das Câmaras Municipais -, a Extinção do Conselho de Estado, além da criação do Município neutro da Corte. O Ato Adicional, porém, não seria plenamente aprovado. As eleições para a regência, 1835 - cujo reduzido universo de eleitores era um retrato de hierarquização social - foram imediatamente seguidas de revoltas que estouraram em diversas regiões: a Cabanagem, a Farroupilha, a Sabinada e a Balaiada, iriam, ao longo dos dez anos seguintes, perturbar o aparente clima conciliador do quadro político.

A maioridade, efetivada em 23 de julho de 1840, seria seguida de novas revoltas . A partir de 1844, as discussões sobre a escravidão e a propriedade de terras voltaram a tomar conta do cenário. Ambas as questões foram solucionadas numa só jogada: em 1852, aboliu-se o tráfico - desta vez, de forma mais rígida - e, em seguida, promulgou-se a Lei de Terras. Esta última, uma vez que restringia o acesso a terra somente pela compra, não apenas colaboraria para a manutenção do quadro econômico latifundiário estabelecido desde o período colonial, como viria a atingir os imigrantes europeus que começavam a chegar ao Império. Ao contrário das promessas recebidas, eles estariam, na sua grande maioria, destinados a compor uma massa camponesa assalariada, em substituição à mão de obra escrava.

Este movimento migratório veio justamente suprir as necessidades do novo latifúndio, voltado à exportação, que emergira nas últimas décadas: as grandes propriedades cafeicultoras, geradoras das novas figuras políticas dominantes, os chamados "barões do café". Mudanças que pareciam colocar o Império do Brasil no patamar das grandes nações européias. Mas que - ao contrário do que ocorria naquelas nações que lhe serviam de inspiração - não implicavam numa maior representatividade do povo junto ao poder, no fim da escravidão ou em uma sociedade mais igualitária.

Assim, os autores de O Império da Boa Sociedade desnudam esta estranha lógica na formação da sociedade brasileira, que tende a subjugar todos aqueles que nela não ingressam. Todos aqueles que, sem oportunidade de participação, ou preferindo os ideais aos interesses, acabam entrando para a história na qualidade de vencidos.

<1> MATTOS, Ilmar Rohloff de. GONÇALVES, Marcia de Almeida. O império da boa sociedade: a consolidação do Estado imperial brasileiro. 7ª ed. São Paulo: Atual, 1991
O Império da Boa Sociedade: A Consolidação do Estado Imperial Brasileiro
Originalmente publicado no Shvoong: http://pt.shvoong.com/humanities/history/371255-imp%C3%A9rio-da-boa-sociedade-consolida%C3%A7%C3%A3o/